domingo, 19 de abril de 2009

Nota sobre "Watchmen..."

O artigo do post anterior foi escrito na semana do lançamento do filme de Alan Moore. Foi negociado com um jornal de Belém. O editor quis publicar mas achou muito grande e pediu que reduzisse de mais de 7 mil toques para 3 mil toques. Eu reduzi para 4 mil mesmo assim o pequeno cardeno cultural do jornal não abarcou o artigo. Durante a negociação eu mantive o artigo exclusivo,depois acabei esquecendo dele. Agora recupero para os leitores do blog.

Watchmen e o crítico Alan Moore


A primeira sessão de Watchmen em Belém não estava completamente lotada, mas causou grande expectativa na plateia, que recebeu as primeiras cenas com gritos e aplausos. Alguns garotos esperaram por três horas no saguão do cinema no então shopping Iguatemi, entre o que seria a primeira sessão, cancelada, e a segunda. Logo percebi que talvez nem um terço dos espectadores tivesse ao menos 10 anos de idade quando a minissérie de Alan Moore e Dave Gigbbons chegou pela primeira vez às bancas do Brasil, no início dos anos 1990.

Pouquíssimos reconheceram todas as personalidades representadas na realidade alternativa do filme, em flashback, que segue à cena de abertura, em que o Comediante é jogado do 30º andar de um prédio. Dada a crise de audição, nem mesmo a nova onda folk paulistana deve ter dado à legião adolescente conhecimento suficiente para reconhecer a versão de Jimi Hendrix para All along the watchtower, de Bob Dylan, que embala uma das seqüencias finais do filme.

Quando comprei a minha primeira edição de Watchmen, aos 15 anos, pouco entendia sobre o que era esse novo “quadrinho adulto”. O gênero se popularizou no mundo todo graças a nomes como Frank Miller e Alan Moore, suas mais notabilizadas expressões. Um dos primeiros gibis adultos que eu comprei foi “Elektra Assassina”, que apesar da arte rebuscada de Bill Sienkiewicz, e do roteiro surreal, foi facilmente assimilada. Diferente de Wacthmen, que coincidentemente perdi numa sala de fliperama depois da aula, quando ainda não estava na metade do intrincado enredo. Era um formato muito novo, narrações paralelas, com capítulos de livros e artigos no final dos fascículos que recuperavam uma história anterior a trama.

O discurso indireto, flashbacks e flashforwards constantes, emaranhados estilísticos. Tudo foi muito difícil para um adolescente. Só acabei lendo Watchmen na íntegra por causa do filme, como talvez pouquíssimos dos que estavam naquela sala o tivessem feito. Fora uma conhecida fã dos quadrinhos de Moore e Neil Gaiman, que enxerguei durante a sessão, e alguns nerds suspeitos a minha direita, quase nenhum deles deve ter lido Watchmen. Trata-se de uma leitura ainda mais difícil para os dias velozes de hoje. Ainda mais com a concorrência dos mangás, que trazem muito movimento e arte gráfica atraente e quase nenhuma leitura.

Frank Miller disse certa vez sobre o fato de Alan Moore criticar as suas versões para o cinema que a diferença entre os dois era que um tinha escolhido ser diretor, e outro, crítico. Moore chegou ao ponto de se negar a assinar o filme oriundo dos quadrinhos mais esperado em duas décadas. Nos créditos iniciais do filme chega ao absurdo de aparecer algo como “Baseado na graphic novel co-produzida por Dave Gibbons”, sem citar o autor britânico. Moore disse que não acredita que seja possível transpor a trama de Watchmen para o cinema. Como crítico, está correto mas creio que defenda muito mais seu papel de artista, tentando preservar o resquício de aura que sua obra pode ter, mantendo-se legítima apenas em seu formato original e em sua época.

Mas Alan Moore se deu ao direito de manifestar-se sobre um tema atual à sua época e isso é ato corajoso para um artista. Diferente de Miller, que preferiu trabalhar grandes ícones do imaginário ocidental (como em Cavaleiros das Trevas ou 300), Moore parodiou vilões reais, quando não deu diretamente nome aos bois, sempre atuais no momento de sua concepção, e ridicularizou os heróis estabelecidos, parodiando-os. Nixon está lá em Wachtmen. O alvo de sua crítica é a guerra fria, está datada, como um bom manifesto político ou cultural de seu tempo.

Não estamos falando do Batman ou do Super-Homem, que podem representar em qualquer momento histórico, no tempo narrativo dos quadrinhos, arquétipos do bem e do mal. Apesar de suas previsões historicamente não confirmadas, com imprecisões que incorrem em todos os futurólogos e a ficção científica de modo geral, Moore engendra técnica e linguagem criativas primorosas. Se não acertou em sua previsão da guerra fria é porque a realidade pode ser transformada inclusive pelas expressões artísticas, ou relatos jornalísticos, como pode sugerir a ação de um repórter tedioso ao final do filme.

Jornalismo, aliás, é parte importante na trama de Wachtmen, sub-valorizada no filme de Zack Snyder. A historinha paralela entre um jornaleiro e um garoto que lê gibis apocalípticos foi suprimida, ficando apenas uma referência visual a essa narrativa paralela, tornando-se mais uma referência destinada apenas aos fãs da graphic novel. A edição de uma revista esperada com expectativa, que trazia denúncias contra o Dr. Manhatan, também foi suprimida. (Claro que muito das supressões do quadrinho original se deveu às exigências do formato comercial das salas de cinema, que mesmo assim, fez o filme ter quase três horas de duração. Snyder promete um DVD com a versão do diretor, contando inclusive a história paralela que acontece dentro do quadrinho do menino negro que troca farpas com o jornaleiro crítico.)

Como no caso Watergate, em que o papel de dois jornalistas do Washington Post foi fundamental para a renúncia histórica de Nixon, Moore deixa em aberto que a farsa mundial criada pelos vigilantes pode vir a ser descoberta a partir de uma investigação jornalística. Moore manifesta o importante papel da imprensa, mesmo que movido por interesses mesquinhos (como manchetes sensacionalistas), na possível transformação realidade.

Por trás de toda a reflexão política e social de Watchmen, restou um filme cheio de efeitos visuais, que apesar de alguma dificuldade, há de ser assimilado pelos adolescentes de hoje como certa facilidade. Snyder ignorou as críticas de Moore e fez um produto de massas, que não deixa de ter um nível crítico, ainda que atenuado.

Por outro lado, a degradação que uma realidade alternativa, ao denunciar com ênfase o imperialismo e as tendências fascistas do governo americano, pode, também, vir a calhar neste momento histórico, quando se confronta esse passado degenerado à expectativa esperançosa criada pela eleição de Barack Obama para a presidência dos EUA, a realidade atual. Seria mais uma vez uma forma de mostrar como os EUA podem se superar e reciclar sua democracia. Todos já sabem como a máquina ideológica de Hollywood funcionava. Ela mostra, com Watchmen, como é capaz de criar a seu favor as críticas mais desfavoráveis. Claro que o distanciamento histórico possibilitou isso, uma vez que a crítica de Moore era datada. Corajosa à época, tornou-se assimilável pela indústria cinematográfica. Mais um motivo para o autor britânico querer se preservar de assinar a autoria do filme. Afinal, ele escolheu ser o crítico.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Música sempre

Deixei de postar muita coisa sobre música nesse período de ausência. Um pouco para me preservar, outro pouco porque este não é exatamente um blog noticioso. Costuma ser um blog de análise, mas eventualmente é um blog particular como outro qualquer. Como diz o meu amigo Relivaldo, nada é gratuito, mesmo o que parece particular aqui é de interesse público. Vou recuperar algumas análises e noticiar alguns fatos importantes.
Para começar com algo bom, vale dizer que o Pará está bem representando no projeto Conexão Vivo, com a banda Madame Saatan e os brasilienses do Soatá. Quem conhece sabe que o Soatá teve origem no Epadu, uma banda paraense da pesadíssima que teve Cláudio Figueredo (ex-Tribo) nos vocais ao lado do compositor e guitarrista Jonas Santos. Foi Jonas que sugeriu o nome do Norman Bates ao vocalista Carlos Bremgartner, quando este ainda estava formando a banda. Há alguns ano em Brasília, Jonas Santos retomou o projeto com a cantora Ellen Oléria e músicos braziliense da pesada. A banda ganhou um swing black mas não perdeu o espírito do carimbó e do rock amazônico que surgiu em Belém (com o Epadu) ao mesmo tempo em que surgia em Recife a Nação Zumbi.

Longo inverno


Todo mundo vende qualidade de vida hoje em dia, já reparou? Você liga a TV e tem uma mulher bonita com um sorriso branquíssimo dizendo para você ligar agora e aproveitar a oportunidade de ter mais qualidade de vida. O refrigerador vai te dar mais qualidade de vida, a camera digital também, e, claro, o enxague bucal que branqueia os dentes, e mais um monte de outras coisas. Eu queria que vendessem esse troço em caixinhas para que a gente pudesse armazenar um bocado e usar quando faltar no mercado.
Há anos não uso mais drogas, a não ser as recomendadas pelo médico. E preciso de muitas hoje em dia. Aos 33 anos, tenho que me preocupar com os rins, com o coração, com a depressão e a taxa de açucar no sangue. Hoje faço exercícios regularmente, bebo uma vez a cada 15 ou 20 dias. Só não parei de fumar definitivamente porque a ansiedade ainda é grande e os ansiolíticos não são a melhor qualidade de vida que encontramos no mercado atualmente. Venlaxin e Trileptal são as melhores, eu recomendo. Mas eu não sou médico, nem sou mulher bonita de sorriso brilhante. Então procure a sua por aí. Minha namorada e minha filha ainda são o melhor complemento a um vida saudável e agradável. O remédio não funciona para todos.
Depois de longo e tenebroso inverno, estou voltando à ativa. Pegando porrada ainda, mas um tiro só não vai me derrubar. Por isso vamos que vamos que vou dar o papo reto pra vocês.

OBS: Foto de Ana Flor