quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Cultura e eleições

Panfleto com os 13 pontos tirados em plenária de cultura do PT quatro anos atrás

Por Nicolau Amador

Quatro anos atrás, quando Almir Gabriel em campanha pelo governo do estado reuniu com artistas no antigo bar Mansuá do Carmo, o então candidato perguntou à classe quanto o segmento representava para o PIB do estado. Qual era sua importância na geração de emprego e renda? Queria números.

Almir não se comprometeu em promover uma política cultural que fosse diferente da que vinha sendo praticada. Ao contrário, repassou a responsabilidade sobre investimentos no setor para a “classe”. Esses recursos, até então, haviam sido dirigidos por uma política elitista que favorecia a poucos iluminados.

Na minha opinião, de forma indireta, Almir fazia um bem cobrando organização, conhecimento e politização da classe que sempre cultivou, até por formação genética, certo individualismo e egocentrismo. Não era algo que eles esperassem, mas era e é ainda necessário saber.

(Poucas semanas atrás, em assembléia com artistas no início do segundo turno, Jatene não cobrou nem prometeu nada, limitou-se a dizer que estava disposto a “errar ou acertar, mas errar ou acertar juntos”. Nada perto de um governo que avançou tanto no setor cultural quanto o de Ana Júlia.)

Ninguém naquela assembléia tinha aquela reposta para dar ao Dr. Almir. Em 2006, os estudos sobre economia da cultura engatinhavam no país e, como tudo por demais evoluído, passavam ao largo da política dominante no Pará.

O Ministério da Cultura, porém, já começara a implantar políticas públicas pautadas também na importância econômica do setor, mas principalmente em sua importância social de inclusão e de democratização de acesso, tanto a recursos para a produção quanto para fruição, pelo menos quatro anos antes.

Saber exatamente qual retorno econômico o investimento em cultura vai dar é difícil e trata-se de uma preocupação por demais neoliberal. Ainda que o retorno econômico dos investimentos em cultura seja claro, esse investimento se faz muito mais necessário nesse momento histórico por sua importância patrimonial, de identidade e de inclusão social. (O debate sobre economia, gestão e responsabilidade será abordado em outro momento aqui.)

No entanto, os governos do PSDB no Pará tendem a planejar a cultura como instrumento de manipulação de opinião pública e com pouca preocupação social ou mesmo econômica, uma vez que os mesmos não são capazes de fazer o cálculo com as variáveis necessárias à economia da cultura (mais sobre economia da cultura em breve).

Hoje a Secult dá a cara a tapa tentando enquadrar as políticas estaduais ao modelo de referência internacional criado pela gestão de Gilberto Gil a frente do Ministério da Cultura.

Quatro anos atrás, quando a plenária de cultura da então candidata Ana Júlia Carepa reuniu artistas na antiga casa de recepções Arte Doce Hall, eu também estava lá. Antes dos artistas definirem os 13 pontos de referência para a política cultural do governo petista, houve um concerto de lamentos de músicos renomados que estavam sem perspectivas musicais pela exclusão daquele governo tucano.

Nunca vou me esquecer do Maestro Jonas Arraes encorajando os colegas, dizendo que tivessem coragem, pois com mais de 30 anos de carreira nunca lhe faltou comida na mesa graças a seu contrabaixo.

Ao contrário da assembléia tucana, que não definiu pauta nem diretrizes, os 13 pontos encaminhados pela assembléia foram impressos e distribuídos durante a campanha de Ana Júlia. Não eram 13 pontos tão bem articulados, pois, como já disse, nossa articulação política cultural também engatinhava. Mas era algo concreto a que se pudesse cobrar.

Ao final dos quatro anos, constato que alguns pontos foram concretizados com louvor, outros foram atendidos parcialmente no processo de inclusão das novas políticas públicas e na pouca participação da “classe” que continua a “egocentrizar”, pra usar um neologismo, e pouco participa de formulações. Outros pontos precisam sair do papel. Mas não há dúvidas de que, para quem esteve oito anos em desvantagem em relação ao governo Lula e mais de 20 anos em relação ao resto do Brasil, avançou muito.

Este ano, como de praxe, estive nas duas plenárias de cultura (PT e PSDB). Na do candidato Simão Jatene vi metade de uma claque armada para aparecer no programa eleitoral da TV e outra metade perplexa quando se viu usada. Quando o cantor Edilson Moreno pegou o microfone e disse que na verdade estavam todos ali para referendar a candidatura me retirei do recinto, ofendido. Fui lá ouvir ou fazer propostas. Não fui endossar nada. Pelo relato de outros colegas soube das queixas da outra metade que não via com bons olhos a volta de um certo secretário ao posto.

Mesmo assim as imagens foram usadas na TV como se os artistas paraenses apoiassem incondicionalmente a candidatura de Jatene. Outros dois colegas entraram na Justiça pelo uso indevido de sua imagem.

Na assembléia de cultura de Ana Júlia não houve promessas a não ser a proposta de continuar avançado naquilo que estava traçado. Com mais de mil pessoas presentes não houve lamentos nem queixas. Apenas o medo do Mestre Alarino do Boi Caprichoso da Cabanagem com medo de perder o apoio que nunca tivera antes.

Isso tem sido mais que suficiente para eu continuar votando 13 aqui e lá. Saiba mais sobre a assembléia de cultura da Ana Júlia aqui, e , e aqui também. E mais aqui.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Festival Se Rasgum divulga programação

Delinquentes: o show mais quente e agressivo do rock paraense marca presença no V Se Rasgum. Foto de Ana Flor

Por Enderson Oliveira*

Nesta segunda, dia 18, foi divulgada a programação da quinta edição do Festival Se Rasgum, que ocorrerá nos dias 12, 13 e 14 de novembro. Este ano a abertura será no Hangar Centro de Convenções, dia 12, enquanto os outros dias, como no ano passado, serão no Afrikan Bar.

Maior da região Norte e um dos maiores do país, o Se Rasgum este ano parece confirmar de vez duas tendências nos atuais festivais de música independente: a variedade de estilos musicais e a extensão do festival além dos dias de apresentações musicais. Para se consolidar em um cenário musical cada vez mais amplo e complexo, torna-se cada vez mais imperioso conseguir alternativas não somente relativas à música em si. Atentos a isso, os organizadores do evento, tendo a frente Marcelo Damaso, mantêm a inclusão de ações de coleta seletiva de lixo, feira de moda e espaço para grafitagem e stencil nos dias de evento.

Merece destaque também a II Semana de Profissionalização da Música Paraense, evento paralelo ao festival e que aponta para novos rumos que devem ser buscados pela/ na música paraense. Temos ritmos dos mais variados estilos, um grande festival, sites com rico conteúdo musical, um público consumidor forte e ávido por novas produções. Só falta uma coisa: maior profissionalismo em algumas ações. E é justamente isto que esta semana de profissionalização objetiva, juntando-se a iniciativas como do ponto de cultura Bafafá Pro Rock e projeto Pará Pro Música, do SEBRAE-PA, na busca pela qualificação dos profissionais da área.

E é sempre bom lembrar que o Se Rasgum tem o patrocínio do Conexão Vivo, projeto que também tem contribuído com a profissionalização e destaque de vários artistas paraenses na cena nacional.


Atrações


Do rock ao ska, do reggae ao dub, passando pelo brega, cúmbia, rap e guitarrada, o Se Rasgum deste ano possui como atrações nacionais o cantor pernambucano Otto, o paulista André Abujamra, Soatá (DF) e as apresentações conjuntas de Odair José (aquele mesmo do “Eu vou tirar você desse lugar...”) e os mineiros do Dead Lover’s Twisted Heart e os acreanos do Los Porongas e Dado Villa Lobos (ex-Legião Urbana).

Do Pará, algumas voltas podem ser comemoradas, como da Mandame Saatan, Deliquentes e Pio Lobato. Outras bandas, que já possuem certa notoriedade nestas bandas dos trópicos serão iniciadas no Se Rasgum: é o caso do Projeto Secreto Macacos, Paris Rock e Mostarda na Lagarta. Como ousadia, a aposta do festival, seguindo a tradição de anos anteriores, este ano é em Nelsinho Rodrigues, o homem do “Gererê” e do “Me libera”.

Para fechar o Se Rasgum 2010, uma atração internacional, a última banda a se apresentar no festival: The Slackers, numa mistura do mais autêntico ska jamaicano, rock e pop. Confira abaixo a programação (em ordem decrescente) dos 3 dias de festival:

Sexta – 12.11

André Abujamra (SP)
Felipe Cordeiro (PA)
Dona Onete (PA)
The Hell’s Kitchen Project (MG)
+ DJ convidados


Sábado – 13.11

Otto (PE)
Félix e Los Carozos (PA)
Cidadão Instigado (CE/SP)
Nelsinho Rodrigues (PA)
Odair José (SP) + Dead Lover’s Twisted Heart (MG)
Graforréia Xilarmônica (RS)
Cabruêra (PB)
Lê Almeida (RJ)
Soatá (DF)
Dharma Burns (PA)
Mostarda na Lagarta (PA)

Domingo – 14.11


The Slackers (EUA)
Madame Saatan (PA)
Los Porongas (AC) + Dado Villa-Lobos (RJ)
Pio Lobato (PA)
Emicida (SP)
Graveola e o Lixo Polifônico (MG)
Delinquentes (PA)
Bruno B.O (PA)
Dubalizer (SP)
Projeto Secreto Macacos (PA)
Paris Rock (PA)

Ingressos
A venda de ingressos começa ainda esta semana, nos seguintes valores:
Passaporte (meia entrada) - 1º Lote - R$ 40,00
Passaporte (meia entrada) - 2º Lote - R$ 50,00
Passaporte (meia entrada) - 3º Lote - R$ 60,00
Ingresso antecipado - R$ 25,00
Ingresso na hora - R$ 30,00



*Enderson Oliveira é estudante de jornalismo do último semestre da Universidade da Amazônia.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

A hora da verdade

II Festival Cultura de Música define selecionados hoje no Gasometro, confira no release abaixo

A ansiedade está chegando ao fim! Neste sábado, dia 16 de outubro, o público conhecerá as canções vencedoras do II Festival Cultura de Música, etapa regional que vai eleger duas composições para participar do II Festival de Música das Rádios Públicas, que reúne as músicas vencedoras de todas as capitais que possuem emissoras públicas. O evento começa às 18h, no Teatro Estação Gasômetro, em Belém, serão apresentadas as 20 músicas selecionadas entre as 74 inscritas. Os ingressos estão sendo sorteados pela Rádio Cultura FM nos programas Matéria Prima e Fonograma, e para participar e conseguir o seu basta ligar para o telefone (91) 4005 7732. No dia do evento serão distribuídos na bilheteria do Teatro.

Uma comissão julgadora elegerá as músicas nas seguintes categorias: “Melhor Música”, “Melhor Música Instrumental”, “Melhor Intérprete Vocal”, “Melhor Intérprete Instrumental”, “Melhor Arranjo” e “Artista Revelação”. As melhores músicas nas categorias de “Melhor Música Com Letra” e “Melhor Música Instrumental” participarão da fase nacional.
Das 20 músicas que serão apresentadas, as 10 mais votadas irão compor o CD do II Festival Cultura de Música. Uma banda base formadas por Edvaldo Cavalcante (bateria), Tiago D'Albuquerque (percussão), Baboo (baixo), Ziza Padilha (guitarra) e Lenílson Almeida (teclados e direção musical), acompanhará os concorrentes do festival. O evento será transmitido, ao vivo, pela Rádio Cultura FM, Portal Cultura (no ícone "rádio ao vivo") e pelo portal da Associação das Rádio Públicas do Brasil (Arpub), por Rosana Rodrigues com cometários de Osvaldo Belarmino Jr e Beto Fares.

Serviço:
II Festival Cultura de Múisica, dia 16 de outubro (sábado), às 18h. Teatro Estação Gasômetro (Parque da Residência) – Av. Gov. Magalhães Barata, 830, bairro São Bras.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Aparecida da Amazônia

Fotos de Walda Marques e texto da reporter Gil Sóter

Por Gil Sóter

Iva Rothe tem nome de estrangeira, tem a pele branca de uma gringa, já estudou música nos Estados Unidos. Mas quando canta, toca e compõe, o que se ouve são batuques e sons da floresta, falando de mitos da floresta, da beleza da floresta. Para Iva, a mata é uma mulher, um universo feminino e faceiro: água, fauna, lenda. Extravagante, exuberante, a Amazônia é uma mulher vaidosa, sedutora. “Feita de várias vozes, de várias morenas, de flores, de fertilidade. Da matinta, da sereia, de encanto”, diz a cantora.

Dessa beleza exótica nasceu o mais recente trabalho de Iva, batizado de maneira certeira: “Aparecida”, alguém que gosta de se mostrar ou aparecer em público, termo típico do linguajar regional. Apesar de ser o terceiro disco da carreira, a vontade de falar das mulheres caboclas vem matutando nos pensamentos de Iva desde o começo de sua trajetória, tanto que o primeiro show solo da artista se chamava “Aparecida”, realizado no teatro Margarida Schivasappa. “Falar de todo esse mistério que cerca o feminino da Amazônia sempre me pareceu muito inspirador”, diz. Isso foi pelos idos de 2000, sendo assim, o disco nasceu já com dez anos de concepção. Uma década de amadurecimento musical e de composição. Tempo para que Iva conhecesse Pio Lobato, parceiro fundamental no disco, ao lado de Beto Fares, que acompanha Iva desde as primeiras gravações e foi responsável pela produção de todos os discos da cantora.

A partir de pesquisa sonora e de entrevistas realizadas com mulheres em comunidades e municípios do estado do Pará, Iva construiu a ambientação do CD, que integra as falas às canções, fazendo das palavras de tantas mulheres parte do ritmo das 13 faixas que compõe o trabalho. O disco foi lançado em março deste ano, em Belém, e depois percorreu o Brasil, passando por cidades como Castanhal (PA), São Leopoldo (RS), Belo Horizonte (MG) e Florianópolis (SC). O álbum foi um dos três projetos paraenses aprovados pelo Conexão Vivo 2010. E agora, o encanto de “Aparecida” volta a Belém, e terá sua segunda temporada no mesmo teatro onde tudo começou. Iva Rothe se apresenta no dia 12 de outubro, às 21h, no teatro Margarida Schivasappa, do Centur.

No show, Iva vai mostrar seus dotes de multinstrumentista: tocará teclado, sampler e o belo piano de cauda do teatro. Na banda, o power trio formado por Pio Lobato (guitarra), Vovô Almeida (bateria) e Maurício Panzera (contrabaixo). O show traz ainda um agrado: Vídea, canção do disco “Aparecida”, será executada pela primeira vez no palco.

Nas canções, vários elementos de percussão que atraem ares de mistério e de natureza, mas também elementos pop, a batida do tecnobrega e do carimbó, dando vida a um repertório que se divide entre faixas de calmaria e de calor, de dança, em contraponto ao disco anterior de Iva, que trazia mantras, como resultado da experiência da artista com a cultura Hare Krishna.


Sobre o Diário de Anapu

Além de passear por cidades fora do Pará, “Aparecida” também deu o ar da graça em uma realidade difícil, que marca os contrastes da terra continental que é o estado do Pará. O projeto do disco foi desdobrado em uma oficina cultural desenvolvida, em julho deste ano, na cidade de Anapu, sudoeste paraense, e palco de uma das mais emblemáticas tragédias dos últimos anos: o assassinato da missionária norte-americana Dorothy Stang, em 2005.

Amiga da religiosa, Iva conta emocionada o episódio que a fez escolher Anapu como um dos destinos de seu projeto. “Uma semana antes do assassinato de Irmã Dorothy, ela veio almoçar conosco em casa, e me disse: ‘Iva por que você não leva sua música para nosso povo?’. E eu não poderia prever que essa seria a última vez que iria vê-la”, diz.

Irmã Dorothy atuava na Amazônia desde a década de 1970. Membro da Comissão Pastoral da terra, era uma das figuras mais ativas na defesa dos trabalhadores rurais da Região do Xingu, marcada por um histórico desastroso de conflitos agrários. Ganhou reconhecimento nacional e internacional por seus projetos de desenvolvimento sustentável e defesa dos direitos humanos numa das regiões de menor Índice de Desenvolvimento Humano do Brasil, e ajudou a fundar a Escola Brasil Grande, a primeira escola de formação de professores na rodovia Transamazônica, em Anapu.

Segundo Iva, a realidade por lá continua severamente igual. “As pessoas continuam sendo ameaçadas de morte diariamente. Enfrentamos cinco dias de viagam para chegar à cidade, que continua extremamente carente”, relata. Apesar de todo a realidade ocre, Iva diz que foi muito bem recebida pelas pessoas da comunidade. “Naqueles dias houve muita música e alegria. Alguns deles se revelaram ótimos compositores, e não falta vontade de voltar e aproveitar esses talentos.”

Como registro dessa expedição ao sudoeste do Pará, o grupo de Iva produziu fotos e vídeos que integrarão a programação do show “Aparecida”. A exposição “Diário de Anapu” vai anteceder o show, às 20h, com o vídeo produzido pelo CEPEPO (Centro de Comunicação e Educação Popular) e as fotografias que Natasha Bittar, da Fotoativa, e Carlos Henrique Gonçalves, da SECULT (Secretaria de Cultura do Estado).

A receita da venda dos CDs será destinada às obras sociais da Associação Mururé - AMU, que tem como objetivo fazer acompanhamento sócio-educativo a crianças, adolescentes, jovens e mulheres da Vila da Barca e Pedreira, em Belém, e do bairro Icuí-Guajará em Ananindeua, através de programas de capacitação e integração. As atividades defendem o acesso à educação, à cultura e ao bem-estar, além da democratização destes direitos.

Serviço:
Show “Aparecida”, de Iva Rothe, 12 de outubro, às 21h, no teatro Margarida Schivasappa. Ingressos a R$ 10 com meia entrada para estudantes, já à venda nas lojas Ná Figueredo e na bilheteria do teatro.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Música para tocar

Mais um registro de Ana Flor

No dia primeiro de outubro, o jornalista Ismael Machado, colunista do caderno Por Aí, do Diário do Pará, e autor do livro “Decibéis sob mangueiras”, sobre o rock paraense, publicou um texto a respeito de Souvenir, da banda Suzana Flag, disco produzido por mim e por Joel Melo, premiado pelo edital da Secretaria de Estado de Cultura em 2008. O disco foi refeito depois da crise interna da banda em 2006. A Suzana Flag é, na minha opinião, reflexo de como ainda precisamos amadurecer para consolidar um mercado e uma política pública séria no setor cultural paraense. Uma necessidade premente é a classe artística se organizar e discutir a necessidade de uma política de Estado e não políticas de governo. Avançamos nesse sentido nos últimos quatro anos, principalmente porque o governo petista abriu finalmente o Estado para as políticas públicas federais, implementadas através do Ministério da Cultura por Gilberto Gil. O texto de Ismael merece o registro. Por isso, transcrevo-o na íntegra.


Souvenir

Por Ismael Machado
Caderno Por Aí - Dário do Pará - 1 de outubro de 2010
Coluna Parabólica

Suzana Flag foi uma das bandas que estiveram na linha de frente naqueles três anos intensos para a música pop paraense, entre 2004 e 2006. De um jeito caseiro, quase tosco de tão artesanal, produziu Fanzine, um belo disco de canções de amor agridoces e urbanas. Período em que a banda tinha uma afiada dupla de compositores, Joel Melo e Elder Fernandes.

Nessa fase vieram canções como Recreio, Ludo Boas Novas, Sem Você e a mais bela e pungente de todas, Contraposto, com uma guitarra que emulava Love Vigilantes, do New Order, uma letra docemente dolorida. Elder saiu da banda. Crises, amadurecimentos, mudanças. Pequenas revoluções internas. O cenário pop paraense mudou novamente. Refluxos.

Como que numa espécie de casulo, a banda começou a pensar num segundo disco. Demorou, mas Souvenir já está aí, filho solto no mundo.

E o que há nesse disco? Uma produção caprichada, um disco feito com esmero. E um conteúdo que parece pegar a banda numa fase de transição, como se, por conta de todas as dificuldades que fazer música pop em Belém as bandas não estivessem sempre em transição.

“E agora que os meus heróis estão acorrentados / cativo o meu algoz / num céu iluminado / de repente o mundo não é tão seguro / vou ficar no meu abrigo...”. Os retalhos de amores, ilusões, sonhos e desesperanças adolescentes se transformaram num híbrido ainda por se definir. É como cantaria a Legião Urbana: “o mundo anda tão complicado”, mas numa melodia completamente doce.

Entre 2005 e 2006 o mundo parecia do Suzana Flag. Um cenário aberto se apresentava. Mas as perdas foram se acumulando. Algumas certezas se diluíram. Mas resta a fé. Aquela que diz para não “não se prostituir e não envelhecer”, como eles mesmos cantam. As certezas podem então ser poucas, mas são verdadeiras. “Você tem medo de chegar aonde quer (...) eu tô no rumo mas vou indo bem / andar errado às vezes convém / caminho longo, atalho até que tem.”

Há um atalho? Há um caminho mais fácil? Pode ser, mas pode ser também que seja preciso dar uma pausa, olhar para os lados, “um repouso ou esforço para recomeçar”.

A produção caseira do primeiro disco ficou para trás. Mixado e masterizado no Rio de Janeiro, o som da banda ganhou qualidade técnica, levou um banho de estúdio. Perderam-se talvez, um pouco da ingenuidade e do frescor do Fanzine, com seu punhado de canções atemporais.

Mas há ligações com esse passado não tão distante. “3d” é uma das canções que resgatam a antiga sonoridade do Suzana Flag. É uma autêntica silly love song, como diria Paul Macartney. E na maioria das vezes essas “tolas” canções de amor são as que tocam mais fundo, buscando espaço entre nossos amuletos, nossos baús emocionais, nossas memórias semi-esquecidas. São como imagens em três dimensões que estão ali ao alcance das mãos. Basta acionarmos.

“Dual” é doce, com um belo quinteto de cordas, que poderia, no entanto, fazer a banda alçar um vôo mais ousado, deixar a música crescer. Ela acaba num repente que pede mais. “Um beijo só lhe tocou, tão forte assim / tão fácil assim // sinta-se só no amor”.

“Se aquilo que você sonhou aconteceu, agora é tarde”. A maturidade cobra preços. O tempo pode ser algoz, mas na música pop essa é uma das lições básicas: queimar intensamente? Pupar-se e ganhar longevidade? São questionamentos. “É pra se divertir, mas não enlouquecer”, eles cantam em Soft.

Mas é na última canção do disco que surge a mais Suzana Flag das canções de Souvenir. “Um dia de cada vez” traz aquela incessante busca pelo pop perfeito que sempre caracterizou a banda. Uma canção que ensina sobre as boas coisas da rotina, do dia-a-dia, se saber que há, sim, as noites de sexta-feira, com os exageros e doses a mais. Só que há sempre também um café da manhã no dia seguinte, sob o olhar atento dos pingüins de geladeira em ressacas cada vez menores, pois o trabalho está ali, na segunda, esperando.

“Mas a alegria é um dom, acredite em você, eu te vejo de manhã”, Susanne canta, como um souvenir para uma manhã de sábado.

sábado, 2 de outubro de 2010

Trilogia punk

Tres momento do show Bodas de Ouro, com Delinquentes, Rennegados e Norman bates


Tres registros da fotográfa Ana Flor. Acima Betox "voa" no palco do hardcore


Vocalista do Norman Bates em momento do show punk mais esperado do ano