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Soft Power: A ministra Marta Suplicy
na abertura da reunião dos "Fóruns
Setoriais", em Brasília. |
Os Colegiados Setoriais de
Cultura, instâncias consultivas que compõem o Plano Nacional de Cultura (cuja
instância superior é o Conselho Nacional de Políticas Culturais – CNPC), tem
nova configuração desde o último dia 15 de dezembro quando encerraram as
reuniões convocadas em Brasília pelo Ministério da Cultura. Neste texto
pretendo registrar os fatos mais importantes ao processo, principalmente,
aquilo referente ao Colegiado Setorial de Música (CSM), do qual fiz parte como membro
nato desde 2005 e do qual me despedi este ano deixando novos colegas no lugar.
Também registro as falas da nova ministra da Cultura, Marta Suplicy, e do
presidente da Funarte, Antonio Grassi, que esteve presente à reunião do CSM.
O encontro reuniu cerca de 450
delegados de todos os 17 colegiados (Design, Música, Teatro, Culturas
Populares, Dança, Artesanato etc.), eleitos em processo eleitoral pela internet
– onde a dificuldade do sistema criado pelo Minc e a burocracia exigida
eliminou mais da metade dos eleitores aptos a votar e muitos candidatos. Essa
dificuldade, fora as dificuldades de locomoção e passagens de muitos delegados,
foi um dos principais motivos de críticas dos delegados na cerimônia de abertura,
onde o diretor do departamento de participação social da Secretaria Nacional de
Articulação Social da Secretaria Geral da Presidência da República, Pedro
Pontual, falou sobre democracia participativa e democracia representativa, e
expôs as ações do governo federal para promover a participação popular no
processo de decisões em várias instâncias.
Apesar da boa vontade demonstrada
por Pontual e o Secretário de Articulação Institucional, João Roberto Peixe, as
críticas se sucederam até que eles não tivessem mais tempo de responder, pois
havia acabado o tempo e era a vez da cerimônia com a participação da ministra.
Além dos delegados, havia observadores como a antropóloga Lorena Avellar, que
prepara a tese de doutorado na USP sobre políticas públicas na área cultural.
Uma das críticas que também
ressoaram no salão do Centro de Eventos e Convenções Brasil 21 foi a da
delegada paraense Edna Marajoara, que reclamou da falta de institucionalização
do “custo amazônico” nas diretrizes do Plano Nacional de Cultura por parte do
CNPC. Produtores, artistas e gestores criticam veladamente o conceito por
acharem ora uma forma de privilegiar a região amazônica sobre as demais, ora
por dizerem que não sabem exatamente do que se trata esse custo.
Fato é que o custo amazônico foi
aprovado como diretriz por grande número de votos na última Conferência Nacional
de Cultura, dois anos atrás. Apesar disso, o CNPC não validou a
institucionalização do conceito – apesar do Minc ter iniciado um programa
compensatório com o edital para micro projetos culturais para a Amazônia Legal.
A defesa de uma política de desenvolvimento artístico e cultural para a
Amazônia foi defendida e tem sido reiterada pelos representantes do Fórum
Permanente de Música do Pará como eu,
Augusto Hijo e Gláfira Lobo, além de muitos outros representantes que
vem participando do processo de construção de uma política nacional de cultura
desde 2005, quando foram criadas as câmaras setoriais. Considero-o, antes de um
conceito econômico, um investimento e uma compensação pela exploração dos
recursos naturais e pela omissão histórica da cultura regional como parte de
suposta identidade nacional. Se falarmos de soft power, como explicitaremos mais
adiante, o potencial é grande. Sem negar, de forma alguma, a contribuição que a
cultura das demais regiões dão ao país.
No final, não obstante as
críticas, delegados e gestores pareceram chegar a um consenso em que, apesar
das falhas, a participação democrática tem sido, na maioria dos casos e a
despeito das mudanças promovidas pela ministra anterior, favorecida pelo Minc.
Pelo menos a impressão que tivemos é que o carisma e a desenvoltura política da
nova ministra Marta Suplicy traz mais segurança ao setor.
O soft power
de Marta Suplicy
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A ministra recebeu de presentes
um Búfalo de balata, tipo de látex
que só dá nas seringueiras do Marajó. |
A abertura oficial da reunião dos
colegiados setoriais de cultura (chamados erroneamente pelo próprio Minc de Fóruns
Nacionais Setoriais) ocorreu pela parte da noite do dia 13 de dezembro, depois
das palestras dos gestores e das críticas dos delegados, com a participação da
ministra Marta Suplicy e de mais duas mulheres: Rosa Coimbra, representando a
participação da sociedade civil no CNPC, e a deputada Dorinha Seabra Resende, representando
a frente parlamentar em defesa da cultura e a comissão de educação e cultura. Silvestre
Ferreira, da Fundação Cultural de Joinville e presidente do Fórum Nacional dos
secretários de dirigentes municipais de cultura das capitais e regiões
metropolitanas, completou a formação da mesa.
Rosa Coimbra reiterou o apoio do
CNPC ao governo, apesar de ressaltar que nem todas as demandas tem sido
atendidas. Dorinha falou sobre a frente parlamentar, que é suprapartidária e
tem conseguido mobilizar muitas questões dentro do Congresso Nacional como a
aprovação recente do Vale Cultura, que chegou a ser anunciado ainda no governo
Lula mas que ainda depende de regulamentação. Ferreira empenhou apoio dos
secretários.
Mas a fala que todos aguardavam
mesmo era a da ministra, que imprimiu um tom descontraído e informal ao seu
discurso. “Eu estou aqui, conversando com vocês, esperando que a gente possa,
junto, entender melhor o processo”, dizia ela.
Marta falou da marca que quer
imprimir à sua gestão. Ressaltou as dificuldades de execução de orçamento e de
falta de interação política e institucional da pasta, e contou como tem contado
com apoio da frente parlamentar, do presidente do senado José Sarney e da
equipe do ministério, que pouco se alterou com a sua chegada recente. “Demos
sorte que ele também é da área”, disse, relembrando a verve literária do
ex-presidente da República e ressaltando a importância dele nas articulações
políticas para a aprovação do Vale Cultura, que ainda depende do convencimento
das empresas que podem ou não adotar o sistema.
O contingenciamento orçamentário
da pasta e a falta de habilidade das organizações culturais com a gestão
financeira dos projetos foram apontados pela ministra como algumas das
dificuldades de implantar uma marca forte. Mas ela anunciou orgulhosa que àquele
momento o ministério chegava ao recorde de 96% de execução do próprio
orçamento.
Falou que o ministério vai
implantar os projetos mesmo que as organizações culturais não tenham fôlego e
convocou os municípios e as instituições a pedirem ajuda se for preciso. “Se
não tiver produtor capacitado para executar os projetos, nós vamos até lá”,
ressaltou a ministra. O anúncio parece coincidir com o edital de seleção de 114
produtores culturais para trabalhar no ministério lançado recentemente.
Mas foi quando falou da
implantação dos CEUs das Artes no exterior que Marta Suplicy reiterou a vocação
de sua gestão para o desenvolvimento integrado entre a economia criativa e a
educação. Para quem não sabe, os CEUs são “centros unificados” que nasceram do
conceito dos Centros Educacionais Unificados, implantados por Marta quando foi
prefeita de São Paulo. A cidade conta hoje com mais de 40 CEUs que oferecem
educação integral, esportes, assistência e cultura aos alunos da periferia.
Marta já começa a implantar CEU’s pelo Brasil e contou como a prefeitura de
Lisboa, em Portugal, lhe ofereceu um terreno para a construção de um CEU lá,
disseminando a cultura brasileira. “Quando chegamos na França, o embaixador
disse que já sabia que nós íamos construir um CEU em Portugal e perguntou
porque não fariam o mesmo em Paris. Eu disse que não tínhamos perna para isso,
e eles nos ofereceram também um terreno para implantar um CEU em Paris, e agora
temos mais um CEU para implantar na Europa”, disse a ministra.
Ela mesma contou das críticas a
respeito de investir dinheiro da cultura no exterior e disse que era
importante, que era soft power. “O
pessoal da economia criativa sabe do que estou falando”, afirmou a ministra.
A partir da página 12 do livro
“Mainstream – A guerra global das mídias e das culturas” (Civilização
Brasileira, 2012), o sociólogo francês Frederick Martel, um entusiasta das
indústrias criativas, explica o conceito de soft
power através do cientista político americano Joseph Nye, então presidente
da Kennedy School, “a prestigiosa escola de ciências politicas e diplomacia”
sediada em Harvard. Nye analisou a “interdependência complexa” das relações
entre os países numa época de globalização e inventou o conceito de soft power, que serve ao governo de
Barak Obama atualmente. Consiste em uma estratégia de sedução que dá poder e
está baseada na cultura e não mais na força militar, o hard power. Segundo o cientista, “o soft power também é a influência por meio dos valores como
liberdade, democracia, individualismo, o pluralismo da imprensa, a mobilidade
social, a economia de mercado e o modelo de integração das minorias nos Estados
Unidos.”
Assim, temos uma ideia do que será
a marca de Marta com os CEUs – em que ela pediu para não economizar, pois,
segundo ela, é com instalações e equipamentos de ponta que a prática das artes
deve se desenvolver entre os jovens.
A renovação do
colegiado de música
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Delegação Norte do Colegiado de
Música: Nicolau, Wertemberg ,
Hijo e Luciano Souza. |
Dada a dificuldade de participação
pelo processo eleitoral implementado pelo Minc, praticamente ao mesmo tempo em
que a ex-ministra Ana de Hollanda caia e ascendia Marta Suplicy, muitos dos 17
colegiados setoriais ficaram incompletos. Cada colegiado é formado por 30
membros, sendo 15 titulares e 15 suplentes. O colegiado setorial de música
contou com a participação efetiva durante as discussões e o processo eleitoral de
32 delegados e membros natos – aqueles que participam do processo desde a
implantação das câmaras setoriais em 2005. Destes, quatro membros natos em
segundo mandato não poderiam participar da renovação dos colegiados, entre eles
o mineiro Makely Ka, o goiano Du Oliveira, o representante do Paraná Manoel Souza Neto e eu. Apesar disso
colaboramos substancialmente para a fluidez do processo, acredito.
Assim sendo o processo eleitoral
tomou início, não sem antes o ator Antonio Grassi, atual presidente da Fundação
Nacional das Artes (Funarte), braço institucional do Minc que organiza os
colegiados/câmaras desde 2005, receber e responder a algumas críticas. Tudo parte
do processo democrático, que eventualmente demonstra alguns gargalos políticos
setorizados ou talvez regionalizados. Grassi
respondeu principalmente sobre a desarticulação da Rede Música Brasil e a
ausência da Feira Música Brasil, e de algumas feiras regionais. Aceitou a
sugestão de Makely Ka para construir um Seminário Nacional da Música.
De volta à reconstituição do
colegiado, como não havia delegados suficientes para uma disputa mais acirrada,
alguns membros natos tentaram mais uma vez repetir o consenso promovido por
amplas discussões entre o Fórum Nacional da Música e o Circuito Fora do Eixo na
última pré-conferência nacional de cultura, em 2010, onde foram eleitos os
delegados que agora deixaram o cargo. Esse “consenso” encontrou, na minha
opinião, muitas dificuldades de ser executado e acabou por colaborar por um
esvaziamento do FNM e um afastamento do CFE depois que Juca Ferreira deixou a
pasta sendo substituído por Ana de Hollanda. Nesta reunião havia três membros
do Fora Eixo, inclusive Ney Hugo, ex-baixista da banda Macaco Bong, que
atualmente conduz os trabalhos do coletivo no Rio Grande do Sul.
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Grassi, da Funarte, rebatendo
críticas. Ele prometeu Seminário
Nacional de Música |
O rodízio entre titulares e
suplentes foi a priori mantido mas é um acordo entre os delegados, que depende
deles e não do Minc. Dessa forma, sugeri que seguíssemos a proposição do CNPC e
elegêssemos primeiramente as representações regionais, já que cinco dos 15
titulares do colegiado são representantes regionais. Cada região, então, se
reuniu e elegeu seus representantes. A região Centro-Oeste contou com apenas
uma representante em todo o colegiado, a produtora Alexandra Capone, irmã do
saudoso Tom Capone. A região Norte teve apenas três representantes aptos no
processo: o paraense Augusto Hijo e Wertemberg Nunes e Luciano de Souza, ambos
do Tocantins (O Pará teria mais um representante apto, o produtor Márcio
Macedo, mas este não pode participar da reunião, pois as datas foram alteradas
e ele tinha um compromisso em Belém com o show do Cabloco Muderno de Marco
André).
O representante da região Norte
escolhido foi o paraense Augusto Hijo que a princípio ficou sem suplente, assim
como Alê Capone. A compositora Ana Terra, do Rio de Janeiro, foi escolhida pelo
Sudeste, e o professor e compositor Ricardo Bordin foi eleito pelo Sul. Val Macambira
foi o representante do Nordeste. Cada regional indicou ainda um delegado para
ocupar uma vaga do colegiado representando também os setores criativo,
produtivo ou associativo. A indicação da região Norte foi Luciano, que é
presidente do Sindicato dos Músicos do Tocantins e participa da Federação
Nacional de Cooperativas de Músicos.
Depois de escolhidos os
representantes regionais foi a vez de eleger os outros cinco titulares, que foram
eleitos no voto. A indicação da região Norte, o músico e produtor Wertemberg Nunes, foi o segundo mais votando
com 14 votos, atrás apenas do maestro Amilson Godoy, de São Paulo, que teve 19
votos. Atrás dele teve Ney Hugo (12 votos), Gabriel Alves (11), Aládia
Quintella e José Raimundo Alves (ambos com 10 votos) – cada delegado votou em
três nomes já que eram seis vagas restantes, uma vez que a região Centro-Oeste
não pôde indicar outro membro.
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Val Macambira e Aílson Godoy,
novos membros do CNPC, com João
Roberto Peixe, da SAI. |
Por fim, depois de uma maratona de
debates que incluiu a tentativa de incluir mais dois membros como suplentes que
ficaram impossibilitados de chegar para a reunião por algum motivo – em geral
por conta da dificuldade do próprio Minc em conseguir passagens para todos –
o novo colegiado elegeu no voto os dois indicados ao Conselho Nacional
de Políticas Culturais (CNPC). Os escolhidos foram o maestro Amílson Godoy,
representando a música erudita, e o baiano Val Macambira, representando a
música popular. Os suplentes ao CNPC, a câmara alta da cultura no Minc, foram,
respectivamente, Luís Felipe Gama, da cooperativa de música de São Paulo, e a
produtora Alê Capone.
Uma das primeiras ações de membros
dos colegiados e outros agentes engajados no processo é uma reunião em janeiro,
no Rio, com a direção da Funarte para a elaboração de um Seminário Nacional da
Música, a que propusemos etapas regionais antecipando a ação.
Meu relato não seria completo
ainda se não registrasse que houve críticas implícitas e explicitas ao modo
como FNM, CFE e outras organizações conduziram o CSM promovendo certo
esvaziamento do mesmo, para o que muito colaborou também a gestão conturbada de
Ana de Hollanda. Principalmente Manoel Souza Neto e Malva Malvar, de Sergipe,
frisaram a necessidade do CSM promover uma mobilização e um debate aberto com
as bases do fóruns, sempre difíceis de mobilizar. Ações práticas como a
conduzida por Val Macambira e correligionários da Bahia e por Ale Capone,
juntamente com o governo do DF tem tido êxito. Acho que o novo momento também
coincide com uma nova articulação do Fórum Municipal de Belém, que reúne vários
membros dos colegiados. Parece um novo momento. Tenhamos esperança e vontade de
trabalhar.