terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Música: políticas públicas setoriais

Pouco mais de 18 pessoas participaram do Seminário promovido pelo Fórum Permanente de Música do Pará (FPM-PA) que foi aberto ontem no auditório do Instituto de Artes do Pará (IAP). Apesar do pouco quórum, ressaltado várias vezes pelos membros da delegação paraense à Pré-Conferencia Setorial, o Seminário contou com presenças importantes como a do Secretário de Estado de Cultura Edilson Moura e Delson Luiz, representante do Ministério da Cultura, que falaram sobre o papel do Estado no fortalecimento da cultura e da participação popular nas políticas públicas dessa área.

Edilson Moura disse que realizou a primeira conferência estadual de cultura aos seis meses de seu mandato e reuniu mais de 10 mil pessoas. “No entanto, a maior parte das pessoas que participam estão ligadas aos movimentos populares, representantes da cultura tradicional, dos afro-religiosos, indígenas, movimentos de bois e de pássaros. Nós sempre tivemos pouca participação dos segmentos da música, por exemplo."

Quando falou que a política de editais e o apoio as iniciativas artísticas ainda não foram suficientes, o secretário tocou num ponto nevrálgico do problema. Os recursos disponíveis para a cultura não são suficientes para atender a todas as demandas, mesmo que o governo compreenda a necessidade de investir nelas. Dentro de qualquer instituição de governo há competição orçamentária. E sempre quem perde é quem tem menos força para fazer cumprir suas reivindicações. Na cultura é assim. Na música é assim. A falta de interesse participativo nas decisões políticas enfraquece qualquer iniciativa e tentativa de construção de uma política pública que saia do “balcão”.

Até hoje tem gente que diz que não reconhece o Fórum de Música. As mesmas pessoas que, quando tinham seus projetos dentro da lista de demandas do Fórum, antes o reconheciam. Ao primeiro sinal de adversidade, desagregam, fogem da briga e buscam a saída mais cômoda, quando enfim vislumbraram saídas satisfatórias aos seus interesses individuais. Ainda saem dizendo que nós é que somos desagregadores. Nossa falta de educação nos impede de desenvolver o conceito de cidadania.

A conversa paralela ao seminário, com colegas muito mais experientes e com muito mais “tarimba” do que o grupo que hoje se reúne em torno do Fórum, denota um desestimulo na batalha. “Quando a gente vai às reuniões, não consegue avançar no debate porque tem sempre alguém que levanta a voz para chorar seus reveses individuais”, disse, em resume, a fonte que prefiro manter em sigilo.

Mesmo assim, o grupo de delegados eleitos na última assembléia está treinando, exercitando a prática saudável e republicana do debate. É um avanço significativo. Melhor ter um debate restrito mas qualificado do que ter a balbúrdia que se viu em outros momentos de ápice de mobilização.

Mas, observe-se, o debate não é restrito por imposição do grupo. Há publicidade em torno desses encontros. Entre as 18 pessoas presentes ao IAP, a maioria são sujeitos atuantes no cenário, pessoas que influenciam e formam opinião. A professora coordenadora do Programa Luamim Heliana Evelyn, por exemplo, levantou questões cruciais sobre as artes e a educação. A trajetória do projeto Luamim, em si, é um exemplo de como a educação pública está comprometida em seus métodos e práticas (principalmente).

Heliana trabalha as artes como instrumento de socialização e transformação social. Mas não pode ocupar os espaços das escolas. Em primeiro lugar porque há muita resistência nos projetos pedagógicos tradicionais sobre métodos de interação. E ela fez uma observação importantíssima. Até esse ano as escolas são obrigadas por lei a oferecer conteúdo de ensino musical na educação básica. “Os governos, porém, construíram salas de aulas ao invés de novas escolas. Os espaços que poderiam ter sido ocupados por auditórios e teatros foram ocupados por mais salas de aula. O professor de música vai dar aula teórica porque o professor de matemática diz que ele está incomodando, fazendo barulho."

Isso me fez lembrar duas coisas. A primeira foi a conversa que tive com o maestro Enaldo, da Orquestra Sinfônica do Theatro da Paz, que lembrou que os alunos são obrigados a estudar matemática mas não são obrigados a estudar música. “A música lida com os sentidos, com a matemática, com a lógica e com a coordenação motora. É um grande instrumento de aprendizado e de desenvolvimento”, observou.

A outra situação aconteceu bem recentemente e comprova isso. Num curso de formação de empreendedores que realizei no SEBRAE-PA, a professora promoveu uma dinâmica que tinha como objetivo, entre outras coisas, testar nossa capacidade de agir em grupo. Ela dividiu a turma em dois grandes grupos e deu a missão: cada grupo deveria apresentar uma espécie de coreografia para a música infantil “Escravos de Jó”.

A excecução é bem simples para quem estava familiarizado com o ritmo. Ao ritmo da música, e seguindo as instruções da letra, uma caneta deve ser passada de uma carteira para a outra em uma coreografia que exigia, como numa banda (ou numa orquestra), sincronia e harmonia.

Cada grupo tinha 20 minutos para exercitar a coreografia e apresentá-la de três modos: cantando a música em voz alta, marcando o ritmo com sons anasalados e, por fim, sem marcação sonora nenhuma, apenas os movimentos. O grupo adversário mostrava-se autoconfiante nos ensaios, executava a coreografia cantada em ritmo acelerado. O nosso grupo, por sua vez, tinha uma pessoa que dizia não conhecer a música e tinha visíveis limitações em acompanhar o ritmo, por mais que nós “ralentássemos” o andamento.

Como esforço concentrado em ajudar a colega em dificuldades, ao final da apresentação, nós nos saímos bem melhor que o grupo adversário. E fiquei pensando (eu que tenho uma filha em idade escolar) o quanto atividades como essas são importantes no desenvolvimento físico e mental de forma muito mais objetiva e prática do que se pode supor o ensino de artes a um tecnocrata ou a um executivo de negócios.

A professora Heliana defende a criação de espaços comunitários para o desenvolvimento de atividades artísticas no bairro. Como o espaço cultural que a UFPA deve construir esse ano para as atividades do Projeto Luamim.

O secretário de cultura observou a boa intenção da delegação paraense dizendo que é assim, promovendo seminários como o que realizamos ontem e que continua hoje, que se constroem políticas públicas, enquanto outros artistas e grupos buscam apoio se dizendo não ser representados por determinados movimentos. Delson afirmou a mesma coisa. A proposição de fixação de índices de investimento na área cultural, inclusive com reservas e índices regionais podem ser proposições da delegação paraense à Pré-Conferência. Bem como a regulamentação do ensino musical nas escolas.


SERVIÇO:
O seminário “Desenvolvimento da Música no Pará” continua hoje a partir das 14h no Teatro Margarida Schivasappa (Centur). Apareça.

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