segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Baianinha balzaquiana


Filosófica e reflexiva, Pitty ganhou o coração dos adolescentes brasileiros no século 21. O existencialismo da cantora e compositora baiana é quase uma crônica dos dilemas da juventude na (pós-)modernidade. Essa tendência marcante no primeiro disco volta neste recém lançado “Chiaroscuro” (Deckdisc, 2009), trazendo consigo a chance de transformá-la em uma cantora ainda mais odiada e ainda mais amada no país. As generalizações que tematizam o medo e o amor são prevalentes neste novo álbum. Mas há traços fortes de amadurecimento.

“8 ou 80”, “Medo” e “Fracasso” avançam nessa linha, tematizando sem apontar saídas, o que já é um traço de amadurecimento. Generalizam os sentimentos na narrativa: “Todo mundo tem segredo” (8 ou 80) “Medo de Ter, Medo de Perder / Cada um tem os seus / e todos têm alguns” (Medo). Em “Fracasso” ela generaliza usando diferente recurso narrativo, quando canta em primeira pessoa, porém, usando um personagem de seu lugar de fala. Apesar de a tendência predominante estar mais burilada, Pitty comete excessos. Os versos finais de “8 ou 80” e “Medo” quase comprometem o todo. Parecem justificar a dissertação. “Rato na Roda” é mais feliz ao perguntar “E se for?”.

“Me adora” é uma canção pop muito forte. Fala de amor e medo sem generalizar. “Água contida” é um exemplo de canção feita sob encomenda. O tema passional não disfarça o que o ritmo tango faz denotar a intenção estética predominante. Mas é uma tentativa que carece ainda de aperfeiçoamento. Em “Desconstruindo Amélia” tenta imputar na generalização o que é, sem dúvida, um “drama” dela mesma, como de todas as mulheres contemporâneas. E é boa, a minha preferida até agora. Não há nada mais sensual do que uma mulher se confessando, se desnudando. Um pouco tímida, um pouco contida, um pouco envergonhada, quem sabe. Pitty se revela aos poucos.

“Todos estão mudos” serve apenas como manifesto (justificativa de seus erros?). Musicalmente é descartável como “Trapézio”. Pitty deu a cara a tapa e não se pode dizer, ao menos, que não é corajosa.

Vale ainda ressaltar que a produção do disco é muito boa e o som vale ser ouvido no CD. A banda soa às vezes como Jane’s Addiction, forte e veloz. “A Sombra” lembra os temas soturnos do Smashing Pumpkins em Adore. A cantora está melhor, menos viciada em seus próprios clichês. Prestes de completar 32 anos, Pitty está deixando de ser uma adolescente tardia e está entrando na melhor fase. O adesivo na capa do disco avisa: trata-se do novo disco depois de quatros anos. Portanto, seu primeiro disco inédito depois de tornar-se efetivamente uma balzaquiana. O melhor ainda está por vir. Esperemos. Ou não.

Um comentário:

Nicolau Amador disse...

Vale dizer o que Sidney Filho me ressaltou. "Me adora" é um brega. Apesar da Pitty fazer em influencia da JOvem GUarda, que tem a ver com o brega clássico de Odair José, por exemplo, a música tem a temática bolerão rasgado e a levada é disfarçada de rock. Mas Sidão tem razão e é isso uma das coisas que a fazem tão legal, talvez o maior hit da cantora até aqui.