Não pude ir a todos os dias, nem esperar todos os shows do Conexão Vivo em Belém. Uma série de trabalhos por entregar, a cobertura do Festival Internacional de Música de Belém, final de semana com a pequena Cecília (minha herdeira), entre outras cositas, impediram-me de acompanhar melhor. Mas todas as coisas que presenciei foram muito boas. A Cria Cultura e a Se Rasgum estão de parabéns pela gestão e produção do evento, assim como o Governo do Pará pelo patrocínio da empreitada, através da Lei Semear, e a Vivo pela iniciativa. Foi tudo muito correto e de alto nível. Como não pude estar em todas, registro alguns dos momentos que presenciei e que considero importantes.
Imprensa e música
A mesa-redonda sobre o papel da imprensa no desenvolvimento da cadeia produtiva. Nesse quesito a gente, aqui no Pará, ainda patina. Como sempre, Beto Fares manifestou opiniões radicalmente discordantes sobre a existência de uma tal cena paraense. O fechamento de alguns movimentos, a xoxagem (gíria para “detonação”), como frisou Alex Antunes, e o preconceito contra movimentos populares como o tecnobrega ainda são grandes desafios para o desenvolvimento da cadeia produtiva da música no Pará. Mas a falta de uma imprensa especializada e interessada na cobertura dos fatos musicais da cidade ainda é um desafio grande. Em dado momento a conversa enveredou pela organização da cadeia. Kuru, da Cria Cultura, disse que ainda não vê organização suficiente no Estado para que esse movimento se consolide a curto ou médio prazo. No entanto, jornalistas de fora, como Fábio Gomes (Blog Som do Norte) e Lauro Lisboa (O Estado de São Paulo), disseram que mesmo sem organização a influência da música do Pará sobre outros artistas e movimentos a nível nacional é uma realidade notável. “Não resistam ao tecnobrega nem a nada do que for bom daqui”, deixou a lição Alex Antunes.
Políticas públicas
A mesa seguinte, reuniu o atual secretario de estado de cultura, Cincinato Marques, Kuru, da Cria Cultura e Fórum Permanente de Música de Minas Gerais, além de Vânia Nogueira (Lei Semear) e Márcio Macedo (MM Produções) para falar sobre políticas públicas. Acostumado a falar sobre excentricidades, a turma dos "independentes" pode conferir a “real” da discussão sobre a sustentabilidade da música no Estado. Os exemplos de Kuru a respeito da organização do Fórum de Minas impressionaram aos presentes. Enquanto, a maioria aqui fica apática, os músicos e artistas mineiros foram para as ruas fazer um panelaço para que os convênios que garantem várias ações por lá fossem realizados. Cincinato foi claro e fluente sobre as problemáticas da cultura no estado, que como ele mesmo frisou, não pode ser comparado a Minas pelas diferenças históricas em sua formação econômica e social. O recado foi dado, o desempenho de qualquer setor cultural depende em primeiro lugar de sua própria organização.
Floresta Sonora
O terceiro momento especial que eu presenciei no Conexão Vivo foi durante os shows. A performance do Circuito Floresta Sonora no palco, ao final da primeira noite no píer das Onze Janelas, foi impecável. Se algum grupo carecia de reunir as qualidades artísticas que qualquer espetáculo musical precisa para ser bem sucedido comercialmente, essa carência foi suprida pelo Floresta Sonora, pelo menos naquele momento. Reunindo as características “regionais” que engrossam a goma de qualquer empreitada musical no Pará. Tudo foi bem armado, desde o início com a “banda base” formada por Calibre, Léo Chermont, Carlinhos Vas e o batera (que não lembro o nome agora) à incorporação progressiva de integrantes, engrossando o som, até a entranda triunfal de Juca Culatra. Culatra contraria seu apelido quando o assunto é performance. Neguinho domina o palco como poucos e tem pelo menos uma música muito, muito boa, que é aquela dos dinossauros: traduz a essência contestatória do reggae em música pop, pronta pra tocar no rádio. Foi um momento mágico, emocionante, que contou ainda com a poesia suja e bela de Alex Antunes. Destaque também para a performance de Calibre, o verdadeiro maestro regente em palco até a entrada de Culatra.
Branca e Preta
Por fim, o segundo momento musical mágico que presenciei foi o show belíssimo de Nina Becker. Lenta e sofistica, a primeira metade do show, com ótimos músicos que a acompanham, contou com uma versão arrasadora de May This Be Love, de Jimi Hendrix. Pouca gente reconheceu (ou conhecia) a música, mas eu fiquei maravilhado. Quando pensei que o som ia continuar na bubuia, com a música bela mas lenta da carioca, Nina chama ao palco Gabi Amarantos, deliciosa e indefectível em seu vestido de tigresa, para atacar de “Vida”, lambada que fez sucesso nos anos 80 com a banda Obina Shock. Na sequencia, a branca e a preta cantaram juntas, e reverenciando uma à outra, “Pimenta com sal”, tornado hit paraense por Lucinha Bastos. Podia ter acabado aí que já valia o ingresso.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário