terça-feira, 17 de agosto de 2010

Reflexões Musicais I

Como desenrolar essa fita cassete?

Ontem foi um dia corrido e me trouxe a oportunidade de refletir sobre algumas coisas. Antes de me reunir com a diretoria da Pro Rock e com a coordenadoria do Movimento Bafafá do Pará, troquei uma idéia com um influente artista paraense ao MSN. Talvez uma das poucas unanimidades críticas da música paraense, ele me cobrou estratégias e propostas para a veiculação da música paraense. “Artista tem é que aparecer”, disse em tom enfático.

Segundo meu amigo artista, na atual circunstância da música popular paraense o que falta são espaços de exibição, seja nas rádios ou na TV. Ele defende vários canais de televisão que veiculem 24 horas por dia a produção cultural paraense.

Como outros artistas é um entusiasta da gestão de Ney Messias frente à Funtelpa. A evidência em que Ney colocou o artista paraense durante sua gestão é algo marcante na trajetória da música local. No entanto, essa visibilidade não extrapolava os limites da Região Metropolitana de Belém porque naquela época faltavam transmissores nos municípios distantes.

Mas meu amigo tem razão quando diz que é preciso ter canais de veiculação da produção artística local. Sem isso não há cadeia que se sustente. A Pro Rock tem um projeto aprovado pelo Conexão Vivo que é um Portal, uma espécie de revista virtual com ênfase na produção musical paraense. Um portal aberto a todas as linguagens estilísticas, um espaço para o exercício critico e público da produção local, que perde cada vez mais espaços nos jornais impressos, nas rádios e nas TVs.

Mas, além disso, tenho defendido no Fórum Nacional de Música que um projeto para o fortalecimento da música brasileira deve passar pela democratização dos meios de comunicação. Não estou falando da Internet apenas. Quem acompanha as polêmicas e discussões da música independente recentemente deve ter lido Lobão dizer que a internet não vai salvar ninguém e que tudo continua como está.

A democratização dos media quer dizer a ocupação das rádios públicas e comerciais - que também são concessões públicas. A democratização dos media quer dizer a ocupação das televisões públicas e comerciais. Mas não é só isso.

Para um artista viver dignamente tem que ter a disposição todos os meios de geração de renda, que segundo Leonardo Salazar, autor do livro “Música Ltda - O negócio da Música para Empreendedores”, são basicamente três, dos quais derivam todos os outros, a saber:

1 - Shows
2 - Produção fonográfica (discos, arquivos digitais etc)
3 - Direitos Autorais

Quando a banda Álibi de Orfeu tocou por cerca de seis segundos no Esporte Espetacular, da Rede Globo de Televisão, o Ecad repassou a banda mais de R$ 1 mil por integrante. Muito mais do que muitos cachês que oferecem por ai. Isso porque a arrecadação se dá em cima da audiência, e a audiência da Globo como todos sabem é muito grande.

Imagine se houvesse uma lei que obrigasse a cotar a música local em rádios e televisões públicas e/ou comerciais. Afinal as cotas foram razoavelmente aceitas em proposições muito mais polêmicas. Mesmo num rodízio longo muitos artistas teriam a oportunidade de se capitalizar.

Menos o meu amigo artista influente. Porque até onde eu sei, ele ainda não se associou a nenhuma arrecadadora (deve estar fazendo isso agora). Você pode ser contra o Ecad e questionar a legislação e tudo o mais, mas como profissional não pode perder a oportunidade de ser remunerado pelo seu trabalho. Enquanto a legislação do direito autoral não muda, é direito do autor (e esperamos que permaneça assim mesmo com as alterações necessárias na lei, pois este é um direito constitucional).

Imagine quanto dinheiro meu amigo dá para o Roberto Carlos! Roberto Carlos?! Sim, eu explico: O Ecad retém direitos autorais por obras, mesmo que elas não sejam de autor regularizado ou filiado a uma arrecadadora. O autor tem até cinco anos para recolher seu direito autoral uma vez que sua obra foi executada e seu direito autoral recolhido.

Já teve arrecadadora que ligou atrás do Suzana Flag para se oferecer para recolher direitos autorais retidos. Sabe o que acontece com os direitos autorais do Suzana Flag depois de cinco anos?! Eles são somados e divididos entre os maiores arrecadadores de cada associação ou do Ecad. Ou seja, o Roberto Carlos recebe os Direitos Autorais do Suzana Flag e de mais um milhar de bandas indies que circulam por ai sem registro tocando em bares, festivais e aparecendo em televisões.

Essas e outras circunstâncias ocorrem porque os artistas paraenses são jovens e ingênuos ou pouco informados. Ou estão em uma situação tal que pouco podem fazer para otimizar os rendimentos de seu trabalho.

Depois de falar com meu amigo artista e antes de me reunir com a diretoria da Pro Rock encontrei com Robson Fonseca, diretor do programa Invasão, da TV Cultura do Pará, que presta consultoria para a Pro Rock na montagem de uma ilha de edição e numa oficina de vídeo que será dada em breve.

Robson, que já produziu excelentes videoclipes paraenses como o da banda Deliquentes (Vagamundo) e Sincera (Admitir) disse que apesar da disposição de veicular a produção local, não há ainda produção e qualidade em quantidades suficientes para veicular tudo.

Além das TVs publicas e universitárias há espaço para ocupar outras frentes de veiculação de massas. TVs a cabo, por exemplo, são obrigadas por lei a abrir espaços comunitários em sua programação. Minha proposta frente ao programa Radiossonico, esbarrou na falta de qualificação de profissionais de comunicação, que não eram os profissionais da radio, mas os produtores do programa.

Falta mão de obra especializada. Meu amigo ainda é reticente e não quer falar de negócios, quer falar de arte. Mas ocupar espaços de mídia exige isso, além de muitas outras coisas. No entanto, meu amigo, sua sugestão está anotada e deve ser pensada com carinho por quem milita na cultura seja que partido for.

2 comentários:

neymessiasjr disse...

amigo Nicolau...prazer postar no teu blog.Teu texto é todo correto,mas dizer que a difusão da produção musical paraense não passava da região metropolitana é um equívoco. Concordo que agora o sinal da funtelpa vai mais longe, porém de que adiante ir mais longe se o conteúdo é ruim???
Outra coisa, difundíamos a produção musical paraense pro Brasil, vide Terruá Pará e todos os festivais independentes de música pelo Brasil afora que levávamos dezenas de bandas paraenses
Vida longa à música do Pará

Nicolau Amador disse...

Obrigado pela sua presença Ney. Acho que a tematica do conteúdo esta bem posta no texto. Como voce sabe, hoje o conteúdo é um problema em toda a televisão e radiodifusão brasileira. Democratizar seria uma alternativa, mas para isso é preciso qualificação tanto artística quanto dos profissionais de comunicação. Isso não ocorre da noite pro dia. Na minha opinião ir mais longe dentro do próprio Estado é importante porque integra e dinamiza. Quando os artistas ocuparem seus espaços de direito poderão alçar voos mais altos. Incentivar a produção independente ajuda a melhorar o conteúdo. As vezes ensinar a pescar é melhor do que dar o peixe. A música sempre sobreviverá. O artista 0800 (aquele que só toca de graça) nem sempre.